Memórias de um Polinerd

By on dez 12, 2012 in Geral, Projetos pedagógicos | 0 comments

Diário de uma história de amor

Voltei para minha cidade há duas semanas, e de repente tudo que eu achava que havia apagado da memória estou relembrando, a cada passo que dou, a cada coisa que vejo, e, principalmente, a cada lugar que visito. Todas as brincadeiras, histórias, até dos momentos em que escrevia meu diário estou me recordando.

Andando pelas ruas, sem rumo, apenas para relembrar os bons momentos, acabei chegando ao banco onde escrevia meu diário secreto, que descobri não ser mais tão secreto assim. E por que eu estava dizendo isso? Simples, encontrei uma caixinha onde havia algumas folhas do diário de “Poliana Barbosa”, uma garota que estudava comigo, onde estava explicando como meu diário havia sumido. Nela estava escrito:

“Eu retornava para casa em um dia muito frio, quando avistei entre a folhagem de um dos canteiros da calçada uma caixinha. Curiosa, peguei-a e levei para casa.”

Durante todo o caminho eu imaginava o que poderia haver lá dentro. Pensei em coisas absurdas como um mapa do tesouro, uma joia que pertenceu a uma rainha, ou quem sabe até um testamento milionário para quem achasse a caixinha.

De tanto imaginar, acabei esquecendo-me de abri-la, tanto é que lembrei quando estava em pé à porta da minha casa.  Curiosa, abri a caixa antes mesmo de entrar em minha casa, e, francamente, me decepcionei, não havia nada do que eu havia imaginado, somente um monte de folhas, “cartas” escritas à mão. Então, comecei a ler.

  —  ’Estou aflito, meu pai saiu de casa três dias atrás, sem dar satisfações, e ainda não voltou. Minha mãe não para de chorar e sinto que ela e meu irmão estão me escondendo algo…’

 Ao terminar de ler a segunda folha da carta percebi duas coisas, a primeira foi que o pai do garoto havia morrido. Como eu sabia disso? Foi a segunda coisa que descobri, as “cartas” eram, na realidade, folhas de um diário de um garoto do meu colégio, que eu vira poucas vezes, cujo nome era Fábio de Alcântara .

Entendem? Folhas do diário de um garoto valiam mais que qualquer diário feminino completo, e o melhor é que elas estavam em meu poder e eu poderia fazer o que eu quisesse, qualquer coisa que eu pudesse imaginar.

Pensei muito, imaginei como ele se sentiria se soubesse que alguém sabe que ele escreve um diário, o quão ele ficaria envergonhado e triste. Então cheguei à conclusão de que não poderia usar de má forma aquelas cartas porque eu estava perdidamente apaixonada por ele.

Imaginem um garoto que escreve um diário! Sem obrigação ou compromisso, apenas para desabafar e registrar no papel quem ele é, como está sua vida e tudo mais. Às vezes, penso que não deveria ter lido, mas logo me lembro de que foi por pura inocência, afinal eu não sabia que se tratava de folhas de um diário, e masculino!

No dia seguinte não fui procurá-lo para explicar o ocorrido, apenas fiquei olhando-o cada vez mais pelo jeito dele: atlético, estudioso, simpático e o garoto mais sensível que eu já havia conhecido. Acho que posso dizer que o conheço, afinal eu li o diário dele, e conhecer alguém de maneira mais verdadeira, impossível.

Eu passei a sempre o observar, mas se já falei pessoalmente com ele cinco vezes, foi muito, se bem que sempre tinha uma pessoa junto a nós, o que impedia que eu contasse que havia lido seu diário.

O único problema foi que adiei muito a hora de contar o ocorrido, até que ele acabou se mudando para o Rio de Janeiro sem saber da verdade, pois como seu pai morrera nada mais prendia sua família à cidade onde morávamos. Ele partiu deixando para trás todos seus amigos e eu.

 Agora, as únicas coisas que me restam são a saudade da época em que eu o observava no pátio do colégio e o tempo vazio na hora do intervalo quando olho para os lados e percebo sua ausência. Mas não perco a esperança de que um dia ele volte, e é por isso que hoje escrevo as primeiras páginas do meu diário, para que um dia eu possa colocá-las numa caixa, e assim ele ou outra pessoa, por obra do destino, as ache e me ame assim como eu o amei através de suas palavras…”

Fiquei perplexo, após ler essa carta duas questões surgiram na minha cabeça: a primeira foi que mesmo tendo lido inúmeras vezes ainda não consigo entender como alguém que mal me conhece poderia gostar tanto de mim, e a segunda foi que, por obra do destino, fiquei perdidamente apaixonado por ela, assim como ela desejou que eu ficasse.

 por  Ernann Tenório

   Memórias de Polinerd é um projeto  de redação da turma do NAVE 1º ano, feito durante o ano letivo de 2012.

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