Memórias de um Polinerd

By on dez 7, 2012 in Geral | 0 comments

Força, Foco e Fé

Em uma cidade pacata do interior, vivia uma garota não muito diferente das outras, ela se destacava apenas por ser bastante focada nos estudos e pelo fato de não sair muito de casa. Seu nome era Gabriela. Nascida em família pobre, vivia com seus pais, Dona Maria e Seu José. Como era filha única, tinha toda atenção e carinho e mesmo simples e humildes, seus pais souberam educá-la. Gabriela tinha os cabelos escuros, pele morena e até que era alta para uma jovem de 17 anos. Desde pequena sempre dizia a seus pais que queria ser uma médica e esse era seu maior sonho.

Gabriela acordava às cinco da manhã e como morava na zona rural, tinha que esperar desde cedo o ônibus municipal passar para poder ir para a escola. Sempre muito atenciosa e esforçada nos estudos quase nunca tinha tempo para conversar, nem fazer muitas amizades, era isolada, mas, ao mesmo tempo, simpática, isso fazia com que ela fosse querida por todos. Quando voltava da escola, sentava-se à mesa e almoçava uma comida muito simples, mas que ela nunca deixara de agradecer a Deus todos os dias pela refeição. Seus pais trabalhavam na roça, passavam o dia por lá. Por mais que precisassem de ajuda nunca chamavam Gabriela para trabalhar na roça, pois sabiam que isso prejudicaria e tomaria o tempo dela nos estudos, que para eles era o único bem que poderiam deixar para a filha.

A família não vivia em condições muito boas, a única renda era o pouco que tiravam da roça. Gabriela usava roupas de segunda mão de pessoas que de alguma forma queriam ajudar, ela costumava vender produtos de beleza catalogados para poder ajudar nos custos da casa, recebia muito pouco, mas aquele dinheiro sempre era bem-vindo. Passava a tarde estudando, só parava para tomar água ou comer uma fruta, muitas vezes não percebia nem a hora passar. Quando seus pais chegavam da roça, dona Maria preparava logo a macaxeira ou a batata trazida por seu José. Os pais iam dormir cedo, pelo cansaço e também por não terem nenhum entretenimento, já que a Televisão que nunca pegou bem, agora estava quebrada. Gabriela passava a noite lendo, era o que mais gostava de fazer, mas sempre ia deitar cedo.

Sua rotina era essa, nada mudava. Apenas aos sábados que ia à feira com a mãe. No fim daquele ano Gabriela iria prestar vestibular, mas mesmo estudando tanto, estava desanimada e triste, pois o curso de medicina só existia na capital e nunca teria condições de se mudar para lá. Contudo, nunca pensou em desistir e mesmo sem ter uma solução, ainda precisava fazer a prova e ser aprovada.

O dia do vestibular chegou, ela acordou mais cedo do que de costume, na verdade mal conseguiu dormir de tanta ansiedade. Já tinha separado o dinheiro do ônibus para ir até a cidade vizinha, onde seria aplicada a prova para toda aquela região. Ao sair de casa, pediu a benção de seus pais, fez o sinal da cruz e em seguida se benzeu.

Chegando lá, procurou logo arrumar seu lugar para sentar. Sua mão estava gelada, dava para perceber sua perna tremendo um pouco, seu rosto pálido demonstrava tamanho nervosismo. Quando o rapaz que ia aplicar a prova a entregou, ela começou a ler e responder, foi aí que começou a ficar tranquila. Gabriela foi a última a entregar a prova, estava com uma aparência bem melhor do que quando havia chegado. No caminho de volta, não abriu a boca para nada, não comentou nada com ninguém, estava apenas pensativa.

Quando chegou a casa, sua mãe tinha feito inhame e preparado uma galinha guisada, que Gabriela adorava. Não falou nada da prova, seus pais também preferiram não comentar nada naquele momento e decidiram que iriam esperá-la pronunciar-se. O resultado saia em um mês. Durante esse tempo, Gabriela resolveu ajudar os pais na roça. Ela fazia de tudo para que o dia terminasse logo e foi assim que se passaram os 30 dias.

No dia do resultado, ela estava apreensiva. A lista de aprovados iria sair às 4 da tarde e seria transmitida pela rádio local. Quando deu a hora certa, pediu o rádio emprestado de um vizinho e começou a ouvir ao lado de seus pais. Cada nome era como se fosse um aperto no coração, quando chegou a letra de seu nome, parecia que ia ter um treco e de repente ouviu soar o nome Gabriela, aquela voz falando bem devagar seu nome, deu a impressão que um anjo tinha descido do céu e suspirado em seu ouvido. A alegria tomou de conta deu seus pais e Gabriela só sabia agradecer a Deus por aquele momento. Depois de tomar um copo com água, sal e açúcar, se viu pensativa e com uma expressão de tristeza no rosto, ela havia lembrado que tamanha alegria não serviria de nada, pois não adiantava somente ser aprovada, precisava de um lar, de livros, dinheiro para se transportar tudo aquilo era mais que a aprovação no vestibular. Seu José, percebendo a tristeza da filha, segurou em sua mão e disse:

- Confie em teu pai Gabriela, nem que eu tenha que derramar minha última gota de suor eu te verei formada, vou te ajudar minha filha, sou pobre e tenho pouco a te oferecer, mas tenho força de vontade e determinação pra pegar numa enxada e tirar da terra todo o nosso sustento, trabalhando dia e noite se for preciso. Ainda temos um tempinho para arrumar uma solução, tua mãe também irá te ajudar, amanhã mesmo vamos à cidade procurar um emprego para ela, enquanto isso continue a rezar e não se desanime, estamos contigo Gabriela!

Naquele momento viu-se dos três rostos escorrer uma lágrima e por aquele instante Gabriela se sentiu mais animada. No outro dia como havia falado, José foi até a cidade com Maria procurar um emprego para a senhora. Meio dia, Gabriela ouviu um barulho de um carro chegando à sua casa. Quando correu para fora viu que era uma caminhonete muito bonita e com certeza de alguém muito rico, do carro desceu logo Maria e em Seguida José, ambos com um sorriso no rosto. A filha ficou sem entender, somente ergueu os braços para os pais. Em seguida desceu do carro o motorista, um senhor alto, de botas e chapéu pelo jeito era um fazendeiro local, que Gabriela cuidou logo de reconhecer, com o senhor estava uma mulher simpática, que era sua esposa.

O homem explicou para Gabriela, que sua mulher precisaria morar na capital e contava com a ajuda de alguém para cuidar da casa que pertencia a ele lá. Logo prosseguiu dizendo que ouviu falar de sua história, e como hoje de manhã havia encontrado seus pais procurando emprego e àquelas horas o que mais se falava na cidade era da “Menina que seria doutora”. Estou disposto a te ajudar. Tive um filho com o mesmo sonho que o seu, porém que não teve a felicidade de realizar, pois partiu cedo. Tu irás fazer companhia a minha mulher, ajudará nos afazeres e terás minha ajuda no que for preciso, já separei umas roupas para ti e tratarei de fazer tua matricula, cuide em arrumar a mala, partirás amanha cedinho comigo, minha mulher e seus pais.

No rosto da menina, estava estampado um sentimento indescritível, uma feição de alguém que não sabia se chorava ou se ria, apenas estava parada e de seu rosto notou-se avermelhar, os olhos brilharem e as lágrimas caírem. Abraçou o fazendeiro, sua esposa e seus pais, mas de sua voz só se ouviu um, obrigado.

Entrou em casa e agradeceu a Deus por tudo aquilo que estava acontecendo, depois cuidou de juntar o pouco de roupa que tinha, com alguns pertences para levar com ela. De manhã todos partiram, Gabriela estava pensativa, porém feliz. Chegando à capital, viram que sua faculdade ficava perto da casa do fazendeiro, que já havia providenciado sua matrícula. Quando tudo estava no lugar, ela já havia feito amizade com Patrícia, a mulher do fazendeiro, o qual atendia pelo nome de Petrônio. No fim do dia se despediu de seus pais, com o coração um pouco apertado, mas na certeza de que daria orgulho aos dois, sua mãe deu-lhe um abraço e não se conteve com o choro, seu pai sempre mais durão deu um beijo no rosto da filha e falou algo em seu ouvido, que provocou um sorriso muito bonito da filha.

O primeiro dia de aula chegou, e Patrícia acompanhou a menina até a faculdade. Chegando lá, ela conheceu a sala onde iria passar um bom tempo estudando, estava com aparência muito boa, vestia roupas bonitas, que havia ganhado de presente. O tempo foi passando, Gabriela cada vez mais apaixonada pelo curso, não parava de estudar e todos os dias ajudava na arrumação na casa, a qual nunca deixou, um dia se quer, suja ou algo parecido. Na quinzena encontrava seus pais, muitas vezes ia de ônibus e voltava no mesmo dia. Ela se destacava na turma, por ser tão silenciosa e se dar bem em todas as matérias.

Um certo dia, viu a tristeza tomar de conta de sua vida, quando recebeu um telefona que dava a notícia de que seu pai havia falecido. Aquilo foi um choque enorme para a garota. Ela foi à cidade, onde foi criada, velar o corpo do pai. Chegando lá encontrou alguns vizinhos dentro da casa, mas a única pessoa que ela conseguia enxergar era mãe, elas se abraçaram, deram-se as mãos e não se separaram em nenhum momento. Gabriela não conseguia conter-se ao olhar para o rosto do pai no caixão, segurava a mão dele que estava fria, ela podia sentir os calos em suas mãos causados por tantos anos de enxada e pegando pesado na roça, para ela não poderia haver tristeza maior, aquele sentimento se comparava a uma facada em seu peito, levaram da garota parte dela.

Gabriela precisava voltar para a capital, estava decidida a realizar o seu sonho e proporcionar, onde quer que seu pai estivesse, o orgulho que ela tanto sonhou em dá-lhe. Patrícia convenceu dona Maria a ir junto com elas, passar um tempo por lá, depois de tanto insistir a mãe aceitou.

Os primeiros meses não foram fáceis, mas a vida continuou. Para ela, o tempo voou, Gabriela estava terminando o seu curso, já se via uma jovem médica bem falada no hospital universitário, tinha propostas de emprego e bolsas para estudar fora. Resolveu prolongar a vida de estudos, se especializou em cardiologia e foi seguindo sua vida. Já ganhava um bom dinheiro dando palestras e participando de cursos, para onde ia nunca deixava sua mãe, que agora se enchia de orgulho da filha. A jovem moça nunca deixou de visitar o local onde seu pai foi enterrado, agora sabia que seu dever estava sendo cumprido e também estava feliz por saber que seu José sempre olhara por ela cheio de orgulho.

A história de Gabriela serve para nos mostrar que a vida é cheia de surpresas, que existem pessoas boas no mundo, que as oportunidades estão aí para quem realmente se interessa e que todo nós temos a capacidade de nos tornamos grandes médicos, engenheiros advogados, só depende de cada um. A vida muitas vezes não nos dá de bandeja tudo que queremos, pois somente correndo atrás dos nossos sonhos é que iremos conseguir realiza-los, para isso precisamos sempre ter força, foco e fé.

por Jorge Rosendo.

 

Memórias de Polinerd é um projeto  de redação da turma do NAVE 1º ano, feito durante o ano letivo de 2012.

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